Atualmente, especialistas têm refletido sobre a criança e o tempo para brincar; ou melhor, a falta de tempo para a criança brincar. Profissionais de diversas áreas se preocupam com as (im)possibilidades do brincar livre, sem hora marcada, criticando os “mini-executivos” que se encontram numa preparação cada vez mais precoce para uma vida de sucesso. São crianças com uma agenda, em busca de um futuro promissor como o de seus pais ou, em outros casos, com as “oportunidades” que seus pais gostariam de ter tido.
E, é assim, em torno deste amanhã brilhante, cheio das melhores expectativas e sonhos dos pais que moldamos este tempo chamado infância. Mas, o que é mesmo que caracteriza este tempo? Ah, a infância é o tempo de brincar, de se encantar, de fazer amigos, de ir às festas de aniversário, de pular corda. Mas será que ainda é assim?
Acrescido a esta discussão, pensemos, agora, em uma criança com Deficiência Intelectual: como fica esta relação tempo x brincadeira hoje em dia? Se, desde cedo, as crianças sem deficiência passam por uma rotina intensa, a criança com Deficiência Intelectual também tem a sua própria maratona: das consultas médicas e terapêuticas aos cursos que garantam a estimulação do desenvolvimento, além dos exercícios domiciliares. Tudo para que o atraso do desenvolvimento se torne “imperceptível”, “normalizando” aquilo que “fugiu à regra”.
Muitos estudiosos falam sobre a importância do brincar para a aprendizagem e para o desenvolvimento infantil, desde os autores clássicos como Piaget e Vygotsky, aos pesquisadores contemporâneos como Bomtempo, Friedmann e Kishimoto. E, também, surgem estudos relacionando o brincar como recurso terapêutico e/ou estratégia educativa, discorrendo sobre a importância de estimular a criança com deficiência desde primeira idade.
Assim, com o conhecimento e certa ansiedade, as orientações dos multiprofissionais passam a fazer parte da rotina diária dos pais para que estimulem seus filhos também em casa ensinando novas brincadeiras e exercícios para estimular coordenação e cognição. E, os brinquedos e brincadeiras deixam de ser o que são e passam a ser “terapêuticos”, “pedagógicos”, numa expectativa de serem quase “milagrosos”. Não podemos negar a importância dos tratamentos e estímulos por terapeutas e educadores, entretanto, há que se olhar para a qualidade dos estímulos na vida cotidiana das crianças com Deficiência Intelectual.
Segundo Maria Inês Britto Brunello (2004), brincar é bom para todos mas, parece que para a criança com deficiência é como se fosse mais uma tarefa a ser cumprida. A autora questiona os familiares e profissionais sobre as possibilidades que oferecíamos para favorecer às crianças com deficiência serem crianças, antes da deficiência. E faz um alerta sobre a sua preocupação com o brincar espontâneo e criativo da criança com deficiência. Dez anos depois, precisamos (re)avaliar se oferecemos condições para que as crianças com deficiência vivam e aproveitem o que a infância tem a oferecer.
Brincamos com a criança com Deficiência Intelectual? Porque se fingirmos brincar, a criança haverá de perceber e abandonar a brincadeira. Portanto, aos pais é preciso apenas que brinquem a brincadeira escolhida, respeitando o ritmo da criança com Deficiência Intelectual.
Especialistas discutem sobre a necessidade de respeitar o ritmo da criança com Deficiência Intelectual. Talvez, o que mais a criança precise, nos dias de hoje, é de tempo: tempo para se interessar, para olhar, para ouvir, para cheirar, para levar à boca, para deixar cair, para rir e, para começar a brincadeira de novo.
Bibliografia:
BRUNELLO, M.I.B. Ressignificando a deficiência a partir do brincar na infância. Cadernos: Centro Universitário São Camilo, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 25-29, jan./mar. 2004.